Autismo: o papel dos reforçadores condicionados no ensino de novas habilidades – Parte I

Com esse texto, darei início a uma sequência de publicações sobre a importância dos reforçadores no ensino de novas habilidades em crianças com autismo.

Os reforçadores (SR) são estímulos que aumentam a frequência dos comportamentos (Skinner, 2003). Ou seja, se a criança está apresentando o comportamento de pedir “água”, é porque esse comportamento foi reforçado em algum momento de sua vida. Dessa forma, para o ensino de novos comportamentos ou para manter comportamentos que já estão instalados, é essencial que haja estímulos reforçadores no processo. Pode-se dizer, então, que o processo de reforçamento é muito importante para as relações humanas mais complexas, visto que, a partir dele, muitas respostas podem ser fortalecidas (Moreira e Medeiros, 2007; Tomanari, 2000).

Existem dois tipos de reforçadores: os incondicionados ou primários e os condicionados ou secundários. Os SR incondicionados são estímulos que, de acordo com a evolução da espécie, se tornaram importantes para a sobrevivência, como comer, dormir, beber água. Já os condicionados são estímulos que adquirem essa função por meio de um processo de aprendizagem (Skinner, 2003), no qual, a partir do pareamento de um estímulo neutro com um estímulo incondicionado, aquele passa a eliciar respostas condicionadas parecidas com aquelas eliciadas pelo estímulo incondicionado (Tomanari, 2000). Como no exemplo: ao parear algumas vezes um sino (estímulo neutro) com uma comida (reforçador incondicionado), o sino torna-se um reforçador condicionado e, sempre que uma pessoa ouvisse o sino (após o pareamento), apresentaria respostas parecidas com as respostas eliciadas pela comida. Então, ao ouvir o sino, a pessoa poderia começar a salivar (como quando apresentada a comida).

Os reforçadores condicionados têm algumas funções (Moreira e Medeiros, 2007; Tomanari, 2000):

  • Mantém o comportamento geral dos indivíduos quando não há reforçadores primários. Por exemplo: se uma criança tem alimentação restrita (ou seja, reforçadores primários não são reforçadores para ela), pode-se utilizar reforçadores condicionados para o ensino de novas habilidades.
  • Produzem uma resposta dentro de uma cadeia de respostas, que, por sua vez, gera uma consequência final – sendo que durante essa sequência, os reforçadores do meio da cadeia se tornam reforçadores condicionados. Então, pensando em uma cadeia de respostas (como lavar as mãos), o estímulo reforçador (água cair após abrir a torneira), será antecedente para a próxima resposta do indivíduo (passar sabonete), que, por sua vez, será reforçado com o próximo estímulo reforçador (água caindo sobre as mãos ensaboadas). Sendo que, este último reforçador, virará um reforçador condicionado com o passar do tempo, por ter sido pareado com os outros elementos da cadeia.
  • São estímulos discriminativos (SD) para a ocorrência do próximo comportamento da cadeia. Assim, como descrito no exemplo acima, a “água caindo após abrir a torneira” (SR) é também, um SD para “passar sabonete” (próxima resposta do indivíduo) e isso acontece até o término da cadeia.

O reforçador condicionado pode ser ainda simples ou generalizado. A diferença entre os dois é que os reforçadores condicionados generalizados servem de ocasião para respostas diferentes. Para se tornar generalizado, ele precisa ter sido pareado com diversos reforçadores primários. A vantagem do reforçador condicionado generalizado é que o sujeito não precisa estar privado para responder por ele. O dinheiro é um bom exemplo, visto que com dinheiro o indivíduo pode emitir vários outros comportamentos que terão como consequência outros reforçadores (como viajar, comprar um livro, comprar comida) (Moreira e Medeiros, 2007; Skinner, 2003).

Além disso, para que um comportamento não entre em extinção, é necessário que o valor reforçador do estímulo seja alto (Skinner, 2003). A força de um estímulo reforçador pode ser variável e depende de algumas razões:

  • Função discriminativa dos estímulos: estímulos discriminativos exercem função de reforçadores condicionados. Ou seja, indivíduos expõem-se mais a situações que existem estímulos discriminativos, porque, na presença dos estímulos discriminativos, haverá reforçamento, logo, o valor reforçador dos estímulos se fortalece (Wyckoff, 1969 apud em Tomanari, 2000, p. 69).
  • Atraso do reforçamento primário: sua força está ligada ao intervalo entre a apresentação do SR condicionado e do primário. Então, se esse intervalo é pequeno, o reforçador condicionado é fortalecido (Skinner, 2003; Tomanari, 2000).
  • Magnitude do reforçador primário: se refere a quantidade de reforço liberado após a emissão da resposta, a duração do reforçador ou a preferência do reforçador. Assim, quanto mais alta a magnitude do reforçador primário, mais alta será a força do reforçador condicionado (Skinner, 2003).
  • Esquemas de reforçamento primário: alguns autores sugerem que se há um esquema intermitente de apresentação do reforçador primário, o estabelecimento do reforçador secundário será mais efetivo do que em esquema de reforçamento contínuo (Catania, 1999).
  • Número de pareamentos: a efetividade de um reforçador condicionado está diretamente ligada a quantidade de pareamentos feitos com o reforçador primário. Pensando assim, a resistência à extinção também será maior em situações que houve pareamento comparativamente a situações em que não houve (Skinner, 2003).

Ao longo da vida, é por meio do pareamento com os reforçadores primários que nós vamos adquirindo novos reforçadores condicionados de forma natural. Entretanto, os indivíduos com autismo têm interesses restritos, por conseguinte, terão poucos reforçadores em sua vida (primários ou secundários), prejudicando a instalação de novos comportamentos, limitando as oportunidades de aprendizagem e de interagir com os colegas. Portanto, é muito importante encontrar novas estratégias para criar reforçadores condicionados para a boa fluência no tratamento deles.

Como esse pareamento não ocorre de forma natural em muitos casos de pessoas com autismo, pensa-se em realizar ensino estruturado com a finalidade de encontrar novos reforçadores. Assim, nessa sequência de textos, falarei sobre quais tipos de estratégias tem-se utilizado atualmente para encontrar novos reforçadores para essa população.

Referências Bibliográficas

Catania, A. C. (1999). Aprendizagem: comportamento, linguagem e cognição. / A. Charles Catania; trad. Deisy das Graças de Souza… [et al.]. 4.ed. – Porto Alegre: Artes Médicas.

Moreira, M. B. e Medeiros, C. A. (2007). Princípios Básicos da Análise do Comportamento. Porto Alegre: ArtMed.

Skinner, B. F. (2003). Ciência e Comportamento Humano. Tradução João Carlos Todorov, Rodolfo Azzi. – 1 Ia ed. – Sao Paulo: Martins Fontes.

Tomanari, G. Y. (2000). Reforçamento Condicionado. Revista brasileira de terapia comportamental e cognitiva, 1(2), 61-77.

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Escrito por barbaranovais

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