Um possível diálogo entre Análise do Comportamento e Comunicação Não-Violenta (CNV)

Pretende-se apresentar a seguir um pouco sobre a Comunicação Não-Violenta (CNV) e algumas questões que fomentam reflexões analítico-comportamentais sobre este tema emergente e que pode ter um relevante impacto nas práticas profissionais de diversas áreas.

Comunicação Não-Violenta (CNV) - Carlos Eduardo Borbolla

Esta metodologia se alinha ao Behaviorismo Radical e as práticas da Análise do Comportamento (AC)?

Tanto a filosofia – behaviorista radical – quanto a sua ciência – Análise do Comportamento (AC) – são amplamente discutidas no Portal Comporte-se e existe vasta literatura sobre seus diversos aspectos. Portanto, os princípios básicos da AC não serão tratados aqui. Mas, se você precisa de uma ajuda para compreender algo, veja o Guia de Leitura de Análise do Comportamento.

A CNV é uma metodologia para comunicação proposta por Marshall B. Rosemberg. Sua principal obra é a primeira fonte de informação sobre este modelo, o qual propõe que podemos melhorar nossas relações interpessoais e profissionais por meio de uma forma de interação honesta e empática (ROSEMBERG, 2006, MARTINOT & FIEDLER, 2016).

Marshall B. Rosenberg foi amigo e aluno de Carl Rogers e, por isto, a CNV possui forte influência do humanismo Rogeriano. A ideia geral por trás da CNV, é que o ser humano tem uma natureza compassiva e que necessita de um contexto favorável para se manifestar.

A partir de experiências pessoais de violência e segregação, o pai da CNV, faz questionamentos comuns a Psicologia: Por que alguns indivíduos, em situações aversivas, mantém-se compassivos, ainda que não deixem de lutar por suas necessidades?

Dos campos de concentração nazista a outras formas de violência, Rosemberg (2006) acredita que a comunicação pode fazer diferença para que as pessoas sejam compassivas. Por isso, a CNV concentra esforços nesta área. Marinot e Fiedler (2016) afirmam que este modelo desenvolve um diálogo cooperativo, compassivo, empático, honesto e que cria intimidade. O procedimento pode ser aplicado em nossa relação conosco, com pessoas ou grupos.

Mas, e para os analistas do comportamento?

O que nos mantém “em contato” com nossos comportamentos benevolentes em situações adversas?

Talvez a primeira pergunta seja – O que é “benevolência”? Para responder, precisamos nos lembrar que os comportamentos verbais devem ser compreendidos com base em sua função e não topograficamente. Além disso, o que em um contexto ou comunidade recebe nome de “benevolência” em outro pode ser seu oposto (SKINNER, 1957).

Uma pessoa enamorada pode dizer a outra “você é um amor”  mas o gesto poderia ser “acolhedor”, “carinhoso”, “chantagista”, “dissimulado” ou “irônico”. O termo empregado pela comunidade verbal sempre depende de uma análise cuidadosa do contexto.

Na ciência, por exemplo, treinam-se os indivíduos para definir com precisão cada termo que empregam. Por isso, é importante questionar: o que são a benevolência, compaixão e empatia, tanto para a CNV, que trata os termos como equivalentes, quanto para a AC?

Rosemberg (2006) afirma que a CNV é compassiva porque demonstra-se, por meio dela – respeito, empatia e a aceitação do outro. Isso é, se oferece validação a experiência pessoal das pessoas, o que pode ser vivido como um sentimento de liberdade – “posso ser quem eu sou” – respeito.

Borges e Cassas (2012) falam do sentimento de liberdade como a experiência que descreve um comportar-se que é reforçado positivamente. Quando nos comportamos e somos reforçados desta forma, temos comumente a experiência de liberdade. Então, talvez possamos pensar na proposta de Rosemberg (2006), e no comportamento compassivo, como uma forma de se comportar verbalmente que é reforçadora.

Além disso, a compaixão e empatia, bases da CNV, são muitas vezes descritas como classes de comportamento equivalentes, também na AC. Kanamota (2013) realizou um levantamento sobre definições de empatia e a manutenção das relações interpessoais aparece como função para diversos pesquisadores. Em outras palavras, esta função parece alinhar-se com as propostas de Rosemberg (2006) que objetivam reduzir a distância gerada por uma comunicação alienante.

Zamignani (2007), por sua vez, ao decompor a classe de comportamentos empáticos do terapeuta, oferece informações que permitem afirmar que três dos quatro componentes da CNV são comportamentos empáticos.

Quais são os principais componentes da CNV?

  1. Descrição de situações sem julgamentos morais;
  2. Descrição de sentimentos;
  3. Descrição de necessidades;
  4. Elaboração de solicitações.

Então, traçadas estas relações preliminares, parece plausível que existem intersecções entre o procedimento da CNV e a visão analítico comportamental. Contudo, é verdade que os comportamentos não podem ser considerados inatos, como propõe Rosemberg (2006), mas sim um repertório desenvolvido ao longo da história do indivíduo e que, segundo Skinner (2003), tem determinantes filogenéticos, ontogenéticos e culturais.

Então, analistas do comportamento podem afirmar que a CNV é um procedimento empático e uma estratégia para lidar com situações aversivas?

É plausível! A CNV pode ser um procedimento com função de minimizar aversivos e também  um procedimento de empatia. Mas, atualmente, nem todos os seus componentes são considerados na literatura como empáticos. Exemplos disso são a realização de solicitações e a auto-expressão de necessidades. Além disso, sua função nem sempre envolve reduzir aversivos. Então, ela pode assumir diversas funções, o que inclui, provavelmente, algumas que seriam bastante úteis no setting psicoterapêutico.

O que você acha? Vamos continuar esta discussão em outro artigo?

Até Breve!

REFERÊNCIAS

BORGES, Nicodemos B.; CASSAS, Fernando A. Clínica analítico-comportamental: aspectos teóricos e práticos. Artmed Editora, 2009.

KANAMOTA, Priscila Ferreira de Carvalho. Estudo da influência das respostas de empatia e recomendação do terapeuta na interação terapeuta-cliente e descrição de efeitos de um procedimento de intervenção para o tratamento de mães de adolescentes com problemas de comportamento. Dissertação de Mestrado. Bauru: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, 2013.

MARTINOT, Annegret Feldmann. FIEDLER, Augusto José C B do Prado A importância da CNV – Comunicação Não-Violenta na realização do processo de autoconhecimento.. Revista Educação-UNG-Ser, v. 11, n. 1, p. 58-77, 2016.

ROSENBERG, Marshall B. Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais. Editora Ágora, 2006.

SKINNER, Burrhus Frederic. Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

SKINNER, Burrhus Frederic. Verbal behavior. New York: Appleton-Century-Crofts, 1957.

ZAMIGNANI, Denis Roberto. O desenvolvimento de um sistema multidimensional para a categorização de comportamentos na interação terapêutica. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo. 2007.

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Escrito por Carlos Eduardo Borbolla

Psicólogo (CRP 157.956/06) - é psicoterapeuta analítico-comportamental, com foco nas terapias de 3ª Geração e Mindfulness. Atua como Acompanhante Terapêutico (AT) e também dentro do Terceiro Setor, com adultos e idosos com Deficiência Intelectual.

Curso: “Capacitação em manejo comportamental de transtornos psiquiátricos “

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