Quem quer Likes?

 

Skinner (1981) afirma que todo Comportamento é selecionado e mantido por suas consequências. Quando esses comportamentos aumentam de frequência, dizemos que determinada consequência é reforçadora para aquele que se comporta e, portanto, tal comportamento tem maior probabilidade de ocorrer novamente.

Os reforços se dividem em naturais e arbitrários. Segundo Guilhardi (2010), reforço natural é aquele produzido pela própria resposta. Dentre os reforçadores naturais existem aqueles que chamamos primários como comida, bebida, sexo, que tem seus reforços intrínsecos à sua natureza.

Um dos reforçadores que também podemos considerar extremamente poderoso são os reforçadores sociais, aqueles que são liberados pela sociedade em que vivemos, como atenção por exemplo. Este tipo de reforço tem ganhado nos últimos anos topografias cada vez mais elaboradas.

Uma dessas topografias se dá por meio das redes sociais, nelas “likes” geralmente tem função reforçadora, isso é possível de ser percebido, quando há um aumento do número de postagens e maior variação dos tipos de posts publicados, gerando mais “likes”.

Na série Black Mirror, que tem como tema central, a relação do ser humano com a tecnologia, podemos observar de forma clara como “likes” podem ser reforçadores.

No primeiro episódio da terceira temporada da série por exemplo, que tem por título “Queda Livre” (se não assistiu ainda, o faça)! Este episódio da série, se passa numa sociedade onde todos têm uma rede social semelhante ao facebook, na qual todos são classificados com uma à cinco estrelas, dependendo do número de seguidores, “likes”. Isso lhes proporciona acesso a estarem nos lugares mais badalados da cidade e a morar em áreas nobres. A personagem principal dessa história é uma jovem que em busca de likes a fim de conseguir uma casa para alugar, num bairro nobre da cidade, para isso ela precisa obter uma nota de, no mínimo, 4,5 numa escala que vai de 1 a 5 para conseguir alugar a casa que tanto deseja.

No decorrer da história ela acaba por deixar de estar sensíveis às relações interpessoais, agindo de forma incompatível com seus sentimentos. Isso nos faz pensar que essa realidade retratada na série, não é muito diferente do que vivemos de hoje, na qual muitas pessoas deixam de estar sensíveis aos reforçadores das relações interpessoais (ao vivo).

Em determinado ponto da série a personagem principal é convidada para ser dama de honra do casamento de uma amiga que tem uma alta pontuação, e ir à festa pode significar mais “likes”, maior pontuação e, portanto, maior probabilidade de alugar a casa que almeja. Na ida para este evento, ela acaba por passar por diversas situações que fazem sua pontuação cair extremamente. Nesse processo, ela volta a descobrir as delícias e desprazeres das relações interpessoais e a viver uma vida mais assertiva em conformidade com seus pensamentos e sentimentos, sem se preocupar com sua pontuação.

Nossa sociedade tem construído uma sociedade onde é extremamente reforçadora as relações via redes sociais em detrimento das relações interpessoais ao vivo, temos construído uma história de arranjo de contingências que contribuem para o cenário atual, onde é mais fácil se expressar através das redes do que ao vivo. Segundo Del Prette e Del Prette (2011), pesquisas têm mostrado que uma boa parte dos jovens vem reduzindo a quantidade e a qualidade de suas interações face a face, o que pode gerar isolamento social.

Segundo Ferreira (2013), alguns estudos citam a existência de uma associação estatisticamente significativa entre o Isolamento Social, a depressão e a solidão.

Por isso, precisamos refletir se estamos deixando de ter contato com aqueles que estimamos para ficar nas nossas casas atrás de “likes”.

 

 

Referências

SKINNER, B. F. Seleção por consequências.Rev. bras. ter. comport. cogn.[online]. 2007, vol.9, n.1, pp. 129-137. ISSN 1517-5545.

GUILHARDI, H. J. Reforço Natural e Reforço Arbitrário. 2010

Instituto de Terapia por Contingências de Reforçamento Campinas – SP

DELL PRETTE, Z. A, DEL PRETTE, A. (2011) Psicologia das Relações Interpessoais. Vivências para o trabalho em grupo. 9 ed. Vozes.

FERREIRA, Débora et al. Isolamento social e sentimento de solidão em jovens adolescentes. Aná. Psicológica [online]. 2013, vol.31, n.2, pp.117-127. ISSN 0870-8231.

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Escrito por Fernanda Cerqueira

Psicóloga Clínica. Mestre em Análise e Evolução do Comportamento pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-Goiás). Especializada em Terapia Analítico Comportamental Clínica pela Unijorge. Psicóloga, formada pela União Metropolitana de Educação e Cultura (Unime) Salvador BA.
E-mail para contato:
nandacerqueira-@hotmail.com

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