Entrevista exclusiva: Mavis Tsai e Robert Kohlenberg [Parte 2]

Damos sequência aqui à entrevista realizada com Mavis Tsai e Robert Kohlenberg, criadores da FAP. A primeira parte da entrevista pode ser acessada neste link.

Comporte-se: Existe algum tipo de certificação para terapeutas e treinadores FAP? O que pensa sobre o tipo de treinamento e experiência que um terapeuta deve ter para trabalhar efetivamente com a FAP em contextos clínicos?

Tsai & Kohlenberg: Sim, temos um programa de certificação para clínicos que querem aprofundar os conhecimentos em FAP. Para se tornar um terapeuta certificado, os requisitos incluem participar de workshops e também de sessões de supervisão individuais para desenvolver as competências essenciais da FAP, que incluem: uma compreensão sólida dos conceitos de análise do comportamento e dos CCRs como classes funcionais; capacidade de se engajar em interações baseadas nas 5 regras e de expressar um repertório naturalmente reforçador de acolhimento caloroso, estabelecimento de confiança, tomada de risco e autorrevelação. Além disso é necessário fornecer uma gravação de uma sessão com um cliente em que existem pelo menos 5 interações ao vivo e uma seqüência completa de implementação de todas as 5 regras dentro da sessão. Além de atender a todos os requisitos para ser terapeuta FAP, os treinadores certificados mostram a profundidade e a amplitude de seus conhecimentos e habilidades participando de workshops intensivos adicionais, liderando treinamentos em FAP, contribuindo para a literatura FAP como primeiro ou segundo autor e passando por um exame oral sobre conceitos comportamentais e da FAP.

Comporte-se: O que você acha da idéia de usar a FAP integrada à terapia de aceitação e compromisso (ACT) ou a outras abordagens como TCC e terapia humanista ou psicodinâmica?

Tsai & Kohlenberg: Acreditamos que a FAP pode ser compatível com qualquer outra abordagem terapêutica. A FAP foi conceituada como uma terapia autônoma ou integrativa, e seus princípios podem ser usados para melhorar qualquer tipo de intervenção. Tivemos uma grande quantidade de feedback positivo trabalhando com terapeutas ACT e TCC, e a ênfase da FAP no papel curativo e central da relação terapeuta-cliente é consistente com terapias psicodinâmicas e humanísticas.

Comporte-se: Gostaria de mudar para outro tópico agora, se você concordar. A FAP, como eu a tenho compreendido, parece ser uma abordagem empiricamente fundamentada para entender o porquê e como os relacionamentos podem curar e fazer as pessoas prosperarem. Ela vem reunindo uma base de evidências muito boa nos últimos 20 anos, com muitos estudos de caso único e, mais recentemente, alguns estudos de eficácia em nível de grupo. Na sua opinião, quais os principais tópicos de pesquisa a serem investigados em relação ao modelo e às aplicações da FAP? Que tipo de novas pesquisas – ou não tão novas – você gostaria de ver sendo exploradas nos próximos 10 anos?

Tsai & Kohlenberg: A pesquisa pela qual estamos mais apaixonados é o projeto Live with ACL meetup mencionado antes, pois é uma abordagem inovadora para lidar com o problema da disseminação e das  inconsistências na maneira como são utilizadas intervenções baseadas em evidências. Conforme discutido por Addis, Wade & Hatgis (1999), as barreiras à disseminação incluem tratamentos que requerem treinamentos e supervisões caros e demorados, os quais não são facilmente acessíveis. A divulgação e a implementação neste estudo são facilitadas por: 1) utilização de protocolos que exigem menos formação ou treinamento profissional; 2) uso de uma plataforma prontamente disponível e acessível para o desenvolvimento do processo (https://www.meetup.com/pro/livewithacl/), tanto para recrutar participantes quanto para realizar a intervenção; e 3) recrutamento de participantes interessados no Meetup, especialmente não-clínicos, para liderar os grupos. Esses grupos facilitam a exploração do que importa profundamente, o compartilhamento com coragem e a escuta com compaixão. Os participantes saem com ferramentas para aprimorar seus relacionamentos e para avançar na direção do que mais valorizam em suas vidas. Estamos avaliando o impacto desses protocolos em um ensaio clínico randomizado e através de pesquisas usando métodos qualitativos e quantitativos.

Jonathan Kanter, diretor do nosso Centro de Ciência de Conexão Social da Universidade de Washington, afirma que a FAP tem muito a oferecer aos pesquisadores e destaca várias outras linhas de pesquisas atuais: 1) estudos de sujeito único detalhados sobre os micro-processos envolvidos no mecanismo de ação da FAP, que mostram que o reforço contingente do comportamento do cliente na sessão é importante; 2) FAP como abordagem transdiagnóstica para ajudar com conexões e relacionamentos sociais, e 3) como treinar terapeutas em FAP. Ele está muito interessado na aplicação das idéias da FAP para diminuir o racismo e os desentendimentos políticos e fazer mais estudos para avaliar a eficácia da FAP como abordagem de psicoterapia, prestando especial atenção às maneiras de torná-la mais fácil de implementar, compreender, treinar e pesquisar.

Daniel Maitland, que acabou de completar dois anos de pós-doc conosco, e foi aceito em um cargo de docência na Universidade A&M, no Texas, tem interesse em realizar estudos para: 1) avaliar o impacto dos diferentes níveis de FAP em termos das regras, 2) entender melhor o papel da intimidade social tanto na psicopatologia como mais particularmente na FAP; 3) avaliar a eficácia da FAP comparada a condições mais fortes de controle/comparação 4) focar na fisiologia como um meio para expandir os tópicos de pesquisa acima.

Referências:

Addis, M. E., Wade, W. A., & Hatgis, C. (1999). Barriers to dissemination of evidence‐based practices: Addressing practitioners’ concerns about manual‐based psychotherapies. Clinical Psychology: Science and Practice, 6(4), 430-441.

Hafner, K. (2016, Setembro 5) Researchers Confront an Epidemic of Loneliness. The New York Times. Recuperado de [Link]

Haworth, K., Kanter, J. W., Tsai, M., Kuczynski, A. M., Rae, J. R., & Kohlenberg, R. J. (2015). Reinforcement matters: a preliminary, laboratory-based component-process analysis of functional analytic psychotherapy’s model of social connection. Journal of contextual behavioral science, 4(4), 281-291.

Holman, G., Kanter, J., Tsai, M., & Kohlenberg, R. (2017). Functional Analytic Psychotherapy Made Simple: A Practical Guide to Therapeutic Relationships. New Harbinger Publications.

Holt-Lunstad, J., Smith, T. B., & Layton, J. B. (2010). Social relationships and mortality risk: a meta-analytic review. PLoS medicine, 7(7), e1000316.

Kanter, J. W., Holman, G., & Wilson, K. G. (2014). Where is the love? Contextual behavioral science and behavior analysis. Journal of Contextual Behavioral Science, 3(2), 69-73.

Tsai, M., Kohlenberg, R. J., Kanter, J. W., Kohlenberg, B., Follette, W. C., & Callaghan, G. M. (2009). A guide to functional analytic psychotherapy. Awareness, Courage, Love and Behaviorism. Nueva York: Springer.

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Escrito por Coluna FAP

Este perfil é destinado à autores convidados pela Coluna de Psicoterapia Analítica Funcional (FAP), que possuem conhecimento ou especialidade em FAP. O objetivo é divulgar a FAP e discutir tópicos relacionados ao modelo em uma linguagem acessível para o leigo, para o clínico, para o estudante e para o cliente. Para tanto, os autores podem contribuir com materiais variados sobre a FAP, como textos sobre conceitos e princípios, casos fictícios que possam exemplificar a aplicação, estratégias e materiais que podem ser utilizados, integração da FAP com outras psicoterapias de base analítico-comportamental, entrevistas com profissionais renomados da área, resenhas ou traduções de artigos ou capítulos importantes sobre FAP, textos voltados ao público em geral que versem sobre o modelo ACL, vídeos em português, entre outras possibilidades.

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