O padrão de um relacionamento: da lua-de-mel à rotina

Na coluna anterior apresentei brevemente o conceito do ciclo da violência e suas implicações para um casal em situação de violência e o terapeuta. Nesta coluna irei me ater a duas fases essenciais dos relacionamentos amorosos: a lua-de-mel e a rotina, nas quais os relacionamentos podem ter diferentes desdobramentos de acordo com a resolução de problemas empregada pelos parceiros.

A fase de lua-de-mel é o início do relacionamento, o princípio da vida amorosa entre dois parceiros tem, mesmo que por períodos curtos de tempo, aspectos de novidade e reforçadores positivos e negativos envolvidos. É necessário que o terapeuta esteja atento a quais seriam esses reforçadores iniciais para que os primeiros comportamentos do relacionamento tenham sido mantidos. Por exemplo, o cliente pode queixar-se de problemas de relacionamento com os pais e com o engajamento em um relacionamento amoroso permanecer menos tempo na companhia dos mesmos. Dessa maneira, após seis meses que o cliente não mora com os pais, será que o valor reforçador é o mesmo da companhia do parceiro? O terapeuta deve estar atento a funcionalidade do princípio do relacionamento na vida do cliente, bem como quais foram os comportamentos mantidos na relação desde o princípio.

As questões elaboradas pelo terapeuta durante a sessão devem possibilitar ao cliente relatar a sua história na velocidade e maneira que preferir, sem julgamentos ou ainda concepções por parte do terapeuta do que seria o adequado ou correto nessas situações. Primeiramente, porque o terapeuta está envolvido com suas próprias contingências sobre o que seria um relacionamento em lua-de-mel e, também, porque diversos mitos sobre felicidade dentro do relacionamento são criados por filmes, novelas e livros que podem prejudicar a visão do cliente e do terapeuta sobre o relacionamento. Aponto essa questão para que não esqueçamos que diferentes contingências estão presentes na vida de cada indivíduo, não havendo uma única forma de se ter um relacionamento satisfatório, e que é direito do paciente determinar a maneira como é a mais adequada para si.

Adicionalmente, diferentes comportamentos podem ser reforçadores no início do relacionamento e perdem seu valor reforçador após um período de tempo, em especial quando as consequências envolvem reforçamento negativo. Ou seja, se o cliente indica que a manutenção do relacionamento em seu início se deu devido a não exposição a seus pais, mudança de casa, sentimentos de proteção por uma ameaça de um antigo parceiro, é fundamental que o terapeuta investigue se há outros comportamentos do parceiro que tenham consequências reforçadoras positivamente para o cliente. Quando o casal está em uma situação de violência é fundamental que o terapeuta consiga identificar a fase da lua-de-mel, razão pela qual o princípio do relacionamento deve ser foco de atenção para a compreensão do ciclo da violência. É importante notar que a fase da lua-de-mel pode ser alterada topograficamente durante o relacionamento, razão pela qual se deve atentar para a função do comportamento.

Outra questão que circunda a fase da lua-de-mel é sua duração, que em relacionamentos violentos pode ser extremamente reduzida e durar semanas, dias ou mesmo horas ou minutos. Não é o tempo em si que define se o casal está dentro de um ciclo violento, mas sim as consequências que os parceiros fornecem ao comportamento do outro. Por essa razão, o terapeuta deve estar atento para as consequências dos comportamentos e não tanto a duração de cada fase dentro dos relacionamentos.

Após um período os comportamentos não possuem mais efeitos reforçadores ou deixam de ser emitidos pelos parceiros e o casal tem uma rotina relativamente estável de atividades e comportamentos. Durante essa fase as habilidades de resolução de problemas do casal terão que ser emitidas de forma mais frequente. Essa fase é crucial para a compreensão dos relacionamentos violentos e, os terapeutas podem buscar qualquer problema que o casal tenha, do mais banal ao mais complexo, para tentar compreender a função dos comportamentos dos indivíduos dentro do relacionamento para solucionar o problema.

Para os relacionamentos em situação de violência é importante verificar se há problemas que são resolvidos sem violência e quais as formas que o casal se engaja nestes momentos e, obviamente, os momentos em que ocorre a violência. Investigar em quais momentos o casal consegue resolver problemas sem violência ou controle de um parceiro mostra-se como uma possibilidade a mais de intervenção para que o terapeuta consiga atuar na resolução pacifica de conflitos.

O ensino de habilidades de resolução de problemas pode diminuir a frequência e a severidade da violência, bem como inserir a possibilidade de generalização para outros ambientes do paciente, como seu trabalho e outras relações familiares. Em relacionamentos não violentos, o casal soluciona ou não dirige mais esforços para o problema e consegue retornar para comportamentos que o parceiro mantém ou que são mantidos por consequências prazerosas. Os relacionamentos violentos têm nestes momentos uma situação de risco na qual o psicólogo deve intervir para evitar riscos para seus pacientes.
Na próxima coluna irei abordar aspectos de intervenção para a resolução pacífica de problemas com técnicas de esquiva e de autocontrole do comportamento agressivo para que o paciente consiga sair de uma situação com potencial violento e controlar seu comportamento a partir de estímulos de seu próprio corpo.

Referência:

Eliminating the battering of women by men: some considerations for behavior analysis. Journal of Applied Behavior Analysis, 28, 493-507.

Marshall, A. D., Panuzio, J., Makin-Byrd, K. N., Taft, C. T. & Holtzworth-Munroe, A. (2011). A multilevel examination of interpartner intimate partner violence and psychological aggression reporting concordance. Behavior Therapy, 42, 364-377.

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Escrito por Sidnei R. Priolo Filho

Psicólogo, Mestre e Doutor em Psicologia pela Universidade Federal de São Carlos. Professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Forense da Universidade Tuiuti do Paraná em Curitiba.

Psicologia do Esporte: da Grécia Antiga – 776 AC até 1930 DC

O uso de técnicas e recursos terapêuticos na terapia de casal comportamental