O Acolhimento no Hospital

O Acolhimento no Hospital

Prof. Dra. Ana Lucia Ivatiuk 
Percebo que a maior parte dos alunos ou profissionais que chegam até mim com a curiosidade de desenvolver uma atividade dentro do hospital estão cheios de expectativas sobre grandes intervenções que poderão realizar. Muitos planos, muitas técnicas, estratégias e leituras realizadas com a intenção de pratica-las com cada paciente que possam ter contato. Acho isso tudo de extrema importância, pois o profissional da psicologia que atua em hospitais precisa sim ter a habilidade de solucionar problemas rapidamente, muito bem desenvolvida e estes requisitos anteriormente citados podem ser um bom argumento para este tipo de prática. 
Porém, acabo frustrando-os quando oriento e procuro modelar o comportamento apenas de acolher ao paciente no momento em que realizam o atendimento. Sim, muitas vezes nossa “grande” intervenção não passa de um momento de acolher ao paciente e suas dúvidas sobre aquele momento em que está passando. 
Para muitos pacientes o momento em que se deparam com uma situação de doença alguns é uma mudança de vida, de rotina e de relações familiares. Principalmente para a realidade do sistema público de saúde. Quantas não são as vezes em que nos deparamos com pessoas que estão há 2, 3 ou mais meses longe da família e não recebem nenhuma outra visita a não ser da equipe de psicologia que o ouve pacientemente nos seus atendimentos. 
Não podemos confundir esse comportamento apenas como uma visita corriqueira, mas sim como uma forma de intervenção que está pautada no comportamento de saber ouvir e orientar apenas com o que for possível e real. 
A maioria das vezes percebo que ouvir no contexto da saúde é o que mais reforça o comportamento de enfrentamento do paciente. Toda equipe em geral entra, realiza procedimento, faz cobranças, propõe intervenções, questiona, cobra, mas poucos são os que perguntam, e tem tempo para ouvir a resposta, de como o paciente esta se sentindo no meio de tudo que esta acontecendo. 
Para alguns pacientes que já passaram por esse tipo de situação em outros momentos, parece que esse enfrentamento é mais fácil e eles muitas vezes conseguem se posicionar diante da equipe. Essa é a realidade dos pacientes portadores de doenças crônicas. Já para aqueles que estão, muitas vezes ainda envolvidos com o descobrir o que esta acontecendo, isso pode ser mais duro e eles se sentirem perdidos, confusos e sem saber qual perspectiva podem ter. 
Certa vez, atendi a uma paciente, o qual foi solicitado por ansiedade e colaborar pouco com a equipe com os procedimentos necessários. Durante o tempo que fiquei com ela, me contou sobre os filhos, o trabalho, sua casa. Ficamos juntas por cerca de 40 minutos e tudo que ela me falou foi sobre a sua realidade. Quando a questionei sobre como estava esse momento de internação, pois ela já estava internada há 60 dias a resposta que ouvi foi “neste tempo todo que estive aqui ninguém me deu oportunidade de contar sobre a minha vida, minhas coisas, agora me sinto com mais coragem para passar o que tiver que passar” (SIC). Depois desse momento, a paciente passou a ser colaborativa e a ansiedade que a equipe relatou anteriormente foi reduzindo a cada dia. 
Acolher é isso: uma escuta contextualizada daquilo que o paciente precisa expor para conseguir enfrentar os momentos do seu tratamento. É lógico que nem sempre apenas isso funciona. Algumas vezes outras intervenções e as técnicas de mudança de comportamento são também muito importantes e eficazes. 

Recomendações de leituras:

Baptista, M. N. e Dias, R. R. (2010). Psicologia Hospitalar: teoria, aplicações e casos clínicos. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.

Filgueiras, M. S. T., Rodrigues, F. D. e Benfica T. M. S. (org.) (2010). Psicologia hospitalar e da saúde – consolidando práticas e saberes na residência. Rio de Janeiro: Vozes.

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Escrito por Ana Lucia Ivatiuk

Possui graduação em Psicologia (CRP: 08/07292-8) pela UFPR (1998) e formação em Fotografia pela escola Portfólio (2011); Especialização em Psicoterapia Comportamental e Cognitiva pela USP (2002); Mestrado em Psicologia Clínica pela PUC – Campinas (2004); Doutorado em Psicologia pela PUC – Campinas (2009). Atualmente é Professora Auxiliar na Faculdade Evangélica do Paraná e Psicóloga Preceptora do Ambulatório de Cirurgia Bariátrica do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. Experiência de 8 anos na área da Saúde, principalmente o campo hospitalar. Também atua como Psicóloga e Coordenadora Administrativa do Crescer com Afeto - Centro de Estudos em Psicologia Clínica e Saúde.

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