COMO OCORRE A INTERAÇÃO NA SESSÃO? UM PASSO A PASSO

Terapeutas iniciantes a terapeutas experientes se questionam, muitas vezes, como ocorre a interação na sessão, isto é, como ocorre a interação entre terapeuta e cliente no aqui/agora do processo terapêutico. Perguntas do tipo “por onde eu começo?”, “quais estratégias eu posso utilizar para evocar CRBs?” (para saber mais sobre o que são CRBs o leitor pode consultar o artigo Psicoterapia Analítica Funcional (FAP): entendendo o cliente na relação terapêutica) “como posso reforçar o comportamento do meu cliente?”, “devo punir o comportamento inadequado do meu cliente? E como?”. Perguntas como essas podem ser muito angustiantes e podem gerar bastante confusão, no entanto, a literatura a respeito da FAP propõe cinco regras (Kohlenberg & Tsai, 2004; Tsai, Kohlenberg, Kanter, Kohlenberg, Follette & Callaghan, 2006 – para saber um pouco mais sobre as cinco regras e o modelo ACL o leitor pode acessar o artigo FAP – o modelo ACL e a mudança de comportamentos na vida do cliente) que podem orientar a ação do terapeuta na sessão. Tais regras foram transformadas em passos por Popovitz e Silveira (2014) e é a partir dessa proposta, bem como das indicações feitas pelos autores acima citados, que as orientações abaixo serão dadas. Então vamos lá!
Com cada cliente primeiramente precisamos ter clara a conceituação do caso, a fim de identificar quais são seus CRBs. Para este momento, o caso apresentado é de um homem (André) que chega à terapia devido ligação realizada por sua esposa (Ana), mencionando conflitos conjugais e queixas freqüentes por parte dela de que ele é muito “fechado” – relato que André corrobora. Tendo o terapeuta nitidez de como esse comportamento se estabeleceu e das variáveis que o mantém, passemos então aos passos da interação terapêutica em sessão.
Passo 1: Paralelo fora para dentro (Regra 1: prestar atenção aos CRBs).
Neste momento o papel do terapeuta é identificar comportamentos-problema do cliente fora da sessão de terapia, estabelecendo relações com os comportamentos-problema que o cliente emite na sessão de terapia (CRBs1). Considerando o relato acima mencionado, podemos imaginar que o terapeuta, neste caso, poderia estar se sentindo como se tivesse que ficar fazendo diversas perguntas, como se estivesse “escavando” o cliente para que ele trouxesse relatos. A partir da constatação do terapeuta de seu próprio sentimento, ele poderia perguntar: “você percebe alguma semelhança em como você se comporta comigo com a forma com que se comporta com sua esposa?”.
Passo 2: Cliente confirma paralelo.
Aqui é o momento no qual o terapeuta tem a oportunidade de investigar se o cliente também consegue perceber essas aproximações. Vamos supor, neste caso, que o cliente confirma o paralelo estabelecido pelo terapeuta dizendo “acho que tem certa semelhança sim”.
Passo 3: Terapeuta evoca CRB (Regra 2: evocar CRBs).
Tomando como ponto de partida que o foco da FAP é o comportamento que ocorre no aqui/agora, em detrimento do relato do cliente acerca do comportamento, o terapeuta deve criar condições (evocar) para que esse comportamento ocorra na sessão. No caso mencionado, uma das formas de evocar esse comportamento, isto é, fazer com que ele ocorra na sessão, seria questionar “como você se sente quando falamos disso?”.
Passo 4: Cliente engaja-se em CRB1.
Levando em conta que na história de André houve consequência aversiva em contextos de autoexposição (dado a ser levantado e confirmado pelo terapeuta no período de conceituação de caso), ele aprendeu a ficar quieto ou a se esquivar de situações como essa. Assim, na terapia, a primeira resposta de André será possivelmente de esquiva, podendo aparecer na topografia de silêncio, de tangenciar o assunto.
Passo 5: Terapeuta responde ao CRB1.
Um dos objetivos da FAP é ajudar o cliente a discriminar os efeitos que o comportamento dele tem nas outras pessoas, no entanto, isso deve ser feito em um contexto bastante acolhedor e em um momento da terapia em que a relação terapêutica esteja bem estabelecida, uma vez que tal ação pode ser aversiva para o cliente por envolver bloqueio do comportamento de esquiva. No caso mencionado, o terapeuta poderia tanto retomar a pergunta inicial (bloqueio de esquiva) ou falar como se sente (ajudar na discriminação do efeito de seu comportamento), dizendo “quando você tangencia o assunto, sinto como se você não estivesse dando a importância que eu gostaria à nossa relação”.
Passo 6: Cliente engaja-se em CRB2.
O contexto terapêutico favorece a emissão de CRBs2 uma vez que o terapeuta fornece consequências diferentes das pessoas da vida do cliente, ou seja, o terapeuta fornece o mínimo de punição para o comportamento daquele. No caso de André, um CRB2 possível seria ele dizer “eu me sinto desconfortável quando fazem perguntas sobre o que eu sinto”. Note aqui que esse comportamento é a emissão de uma melhora porque diz respeito a falar algo de si, ser mais “aberto”.
Passo 7: Terapeuta responde a CRB2 (Regra 3: reforçar CRBs).
Aqui se encontra um dos momentos centrais da FAP, momento no qual o terapeuta tem o poder de reforçar melhoras do cliente, fornecendo consequências diferentes (reforçadoras) daquelas vivenciadas em sua história (aversivas). No caso de André o terapeuta poderia reforçar a emissão do CRB2 dizendo, por exemplo, “quando você diz que é difícil pra você, me dá vontade de dar o tempo que você precisa em vez de questionar novamente”. Note aqui que, a partir da abertura de André, o terapeuta fornece uma consequência que seria reforçadora para a “abertura” dele – no caso, dar o tempo que ele precisa.
Entre os passos 7 a 9 o terapeuta deve iniciar o processo da regra 4 que se refere a observar os efeitos potencialmente reforçadores do comportamento do terapeuta em relação aos CRBs do cliente. O terapeuta deve observar se a forma como ele se comportou teve efeito reforçador ou não, ou seja, se o comportamento-alvo do cliente aumentou ou não de frequência.
Passo 8: Cliente engaja-se em mais CRB2.
Como a ação do terapeuta foi diferente da ação de outras pessoas fora da terapia e, se reforçadora (só sabemos disso ao observar o aumento na frequência de melhoras), o cliente passará a emitir mais CRBs2. Para André, mais CRBs2 poderiam ser ele falar mais sobre como se sente ou até mesmo chorar, uma vez que isso poderia ser considerado estar mais “aberto” às relações.
Passo 9: Terapeuta pergunta sobre o efeito da resposta (Regra 4: observar os efeitos potencialmente reforçadores do comportamento do terapeuta em relação aos CRBs do cliente).
Neste passo o terapeuta pode questionar claramente sobre o efeito que o comportamento dele teve sobre o comportamento de André, fazendo uma pergunta tal como “como foi pra você ouvir o que eu disse?”. Esta ação do terapeuta pode ter a função de investigar o efeito, evocar CRB2, além de ajudar o cliente a discriminar se esse efeito foi ou não reforçador.
Passo 10: Cliente engaja-se em CRB2.
Partindo do princípio de que o terapeuta passou a ser estímulo reforçador para o cliente, o CRB2 tende a ser mais frequente. No caso de André, ele poderia dizer que se sentiu mais livre para dizer o que sentia após o terapeuta dar o tempo que ele precisava.
Passo 11: Paralelo fora para dentro (regra 5: forneça interpretações de variáveis que afetam o comportamento do cliente).
Da mesma forma que o terapeuta fez o paralelo de dentro para fora, ele deve fazer o paralelo no sentido contrário. No primeiro caso se tratava de observar se o comportamento-problema relatado ocorria também na relação terapêutica. No segundo caso, se trata de observar e indicar que o comportamento-alvo, que em um primeiro momento ocorreu na relação terapêutica, pode ocorrer fora dela (com a esposa de André, por exemplo). O terapeuta pode questionar André se seria possível Ana sentir algo semelhante ao que o terapeuta sentiu quando ele expôs o que pensava. Ou então, o terapeuta pode afirmar para André que sua esposa pode sentir algo semelhante ao que o terapeuta sentiu quando André expressou o que sentia (se você fizer “x” pode acontecer “y” – o fornecimento de uma regra que pode ser útil). Tais ações podem ser muito importantes, pois auxilia na produção de regras mais efetivas e aumenta o contato com variáveis de controle.
Passo 12: Lição de casa.
Por fim, o papel do terapeuta é ajudar o cliente a emitir o comportamento-alvo fora da sessão (generalização). Isso pode ser feito por meio do fornecimento de lições de casa (sempre considerando o momento apropriado para isso, se as pessoas fora da sessão estarão em condições de reforçar o comportamento do cliente). No caso de André, o terapeuta poderia dizer “tente expressar o que você sente para sua esposa”.
Os passos mencionados podem orientar o terapeuta na sessão, fornecendo dicas de como se comportar em relação ao cliente em benefício deste, facilitando melhoras. No entanto, é importante lembrar que cada passo está pautado em uma análise do caso em que são realizadas análises funcionais com o intuito de identificar claramente os CRBs do cliente. Lembre-se, os passos e os exemplos apresentados não podem ser tidos como regras sem antes ser realizada a análise adequada.

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Escrito por Antoniela Yara Marques da Silva Dias

Antoniela Yara Marques da Silva Dias é graduada em psicologia pela UFPR, é especialista em psicologia clínica pela FEPAR, mestra em psicologia pela UFPR e doutoranda em educação pela UFPR. Atua como docente e psicóloga clínica com grande interesse na FAP e na área de relacionamentos amorosos desde a prevenção ao tratamento.

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