Prevenção ao suicídio em nível individual: O papel da empatia no salvamento de vidas

Photo by unknown author. Available through CC0 License via Pexels.
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Setembro foi o mês escolhido pela International Association for Suicide Prevention para a conscientização sobre prevenção ao suicídio. No dia 10 desse mês – dia mundial de prevenção ao suicídio – milhares de pessoas ao redor do planeta se conectam para comunicar que o suicídio pode ser prevenido, convidando a população, empresas e autoridades a se engajarem em ações com este objetivo: salvar vidas através de ações de prevenção.

A prevenção ao suicídio pode ser implementada por diversas formas tais como (1) restringindo o acesso aos métodos de morte por suicídio, (2) cobertura midiática responsável e não sensacionalista ao tópico, (3) introdução de políticas públicas sobre o uso de álcool e outras drogas, (4) investimentos em serviços públicos de saúde mental e treinamento de profissionais, e (5) contando com suporte da sociedade para a implementação de tais ações de prevenção [1]. Apesar de extremamente necessárias, tais medidas parecem estar um pouco longe daquilo que nós, pessoas comuns, podemos fazer cotidianamente. Embora possamos também interferir em ações institucionais como grupos organizados de pessoas (somos seres políticos), a prevenção ao suicídio também pode ser alcançada em nível individual.

Dese’Rae L. Stage é uma psicóloga americana que sofreu por nove anos com comportamentos autolesivos e sobreviveu a uma tentativa de suicídio catalisada por um relacionamento emocionalmente e fisicamente abusivo. Foi diagnosticada com Transtorno Bipolar em 2004. Junto a essas experiências, Dese’Rae perdeu amigos por suicídio, além de ter perdido recursos devido ao seu histórico de dificuldades. Tudo isso a levou a iniciar um projeto chamado Live Through This. Para este desafio, Dese’Rae levantou, em Fevereiro de 2013, US$ 23 mil através de doações por crowdfunding (financiamento colaborativo). Este é um projeto que coleciona fotografias e histórias (entrevistas) de pessoas que sobreviveram a uma tentativa de suicídio. Em uma dessas entrevistas, Michael Skinner disse ao fim de seu testemunho: “Eu quero viver. Eu quero viver. E eu quero ajudar a quebrar aquele silêncio para que outros queiram viver também. Há esperança lá fora, há cicatrização, e há ajuda. Vamos quebrar o silêncio. Precisamos acabar com este silêncio, com o estigma, e com a discriminação ao redor do suicídio, e todas essas questões que nos levam a ele, sejam elas quais forem”. Quebrar o silêncio. Acabar com o estigma. Deter a discriminação. Michael aponta questões que estão presentes em nossa vida diária: como tratamentos as pessoas que sofrem de algum sofrimento psicológico. Nossas atitudes para com elas são o ponto crucial para prevenir o suicídio. Elementos-chave para a prevenção são compaixão e empatia.

Escrevendo para o Big Think, a escritora americana Lori Chandler afirma que a “empatia é o portão para a compaixão. É compreender como alguém se sente e tentar imaginar como aquele sentimento se manifestaria em você – é uma forma de se relacionar com o outro. A compaixão vai um pouco mais além. É sentir o que aquela pessoa está sentindo, abraçar tal sentimento, aceitar que ele existe, e tomar algum tipo de atitude a partir daí”. Chandler menciona um estudo conduzido por Fredrickson e colaboradores [2] com evidências de que demonstrar empatia a alguém contribui para o aumento da satisfação de vida e reduz sintomas depressivos daqueles que demonstram empatia. Por outro lado, para os que são alvos de empatia e compaixão, tais ações desempenham um papel fundamental na prevenção ao suicídio.

Um estudo conduzido por Mueller e Waas [3] revelou que pessoas com níveis mais altos de empatia percebem características afetivas e comportamentais associadas ao suicídio como mais sérias e preocupantes. O estudo também mostrou que pessoas mais empáticas apresentaram mais chances de prover assistência a indivíduos que experienciavam dificuldades emocionais e comportamentais. Os autores do estudo mostraram que tais resultados são consistentes com um extenso corpo de pesquisas indicando que pessoas com índices mais altos de empatia tendem a ser mais afetivas, mais sensíveis aos outros, e mais dispostas a prestar apoio a pessoas que experimentam algum tipo de sofrimento psicológico. Algo importante a ser mencionado aqui: empatia pode ser aprendida e desenvolvida.

A Organização Mundial da Saúde [1] enfatiza que o suicídio não é um fenômeno inevitável. Muitas vidas foram salvas através de atos de compaixão e empatia daqueles que estavam ao redor. Não há evidência que dê suporte à ideia de que perguntar sobre suicídio provocará ideações suicidas. Falar abertamente, de modo não crítico, afetuoso, e provendo suporte é a melhor maneira de iniciar prevenção ao suicídio quando suspeitamos que alguém está vivenciando um sofrimento intenso. Não se trata de resolver os problemas da pessoa que sofre ou propor soluções imediatas. Escutar de modo respeitoso e encorajar a pessoa a procurar ajuda profissional de saúde mental (psiquiatra e psicólogo) são ações inestimáveis neste processo.

Ainda sobre a importância da empatia e da compaixão na prevenção ao suicídio, Michael Skinner, em sua entrevista ao Live Through This, diz: “Penso que gentileza, compaixão e cuidado exercem um profundo efeito. Eu realmente acredito nisso. Mesmo que essas ações não tenham as respostas, ou que eu não tenha as respostas, se alguém está sendo validado e valorizado, eu acredito que isso possui um efeito imenso no início da cicatrização da dor”.

 

Se você leu este texto e sente que precisa de ajuda imediata, o Centro de Valorização da Vida (CVV) está à disposição para conversar a qualquer momento do dia e da noite. Ligue gratuitamente 141 ou acesse http://www.cvv.org.br.

 

Referências:

[1] World Health Organization. (2014). Preventing suicide: A global imperative. Geneva, Switzerland.

[2] Fredrickson, B. L., Cohn, M. A., Coffey, K. A., Pek, J., & Finkel, S. M. (2008). Open Hearts Build Lives: Positive Emotions, Induced Through Loving-Kindness Meditation, Build Consequential Personal Resources. Journal of Personality and Social Psychology, 95(5), 1045–1062.

[3] Mueller, M. A., & Waas, G. A. (2002). College students’ perceptions of suicide: the role of empathy on attitudes, evaluation, and responsiveness. Death studies, 26(4), 325-341.

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Escrito por Tiago Zortea

Possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo, onde atuou como pesquisador-bolsista do Ministério da Educação pelo Programa de Educação Tutorial em Psicologia. Possui mestrado em Psicologia pela mesma instituição na área de Evolução e Etologia Humana (Bolsista CAPES). Possui formação em Terapia Comportamental pelo Instituto de Terapia por Contingências de Reforçamento (ITCR) e atua em consultório particular no trabalho com crianças, adolescentes e adultos. Atualmente é pesquisador de PhD na University of Glasgow (Escócia, Reino Unido), membro do Suicidal Behaviour Research Laboratory, onde pesquisa sobre comportamento suicida e práticas parentais. É membro da British Psychological Society e revisor do periódico Archives of Suicide Research (International Academy of Suicide Research). Trabalha com os seguintes temas/áreas: Suicídio; Comportamento Suicida; Autolesão; Prevenção ao suicídio; Práticas parentais; Psicologia Clínica; Análise do Comportamento; Etologia Humana; Investimento Parental.

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